IA na escola: Inteligência artificial prova que precisamos de mais professores(as)
- Marcus Bruzzo
- 25 de jul.
- 6 min de leitura
Atualizado: 31 de jul.
As instituições de ensino se tornaram espaços de tráfego de textos do Chat GPT.

Escolas e universidades estão inundadas por textos feitos por IA, usados por alunos e professores.
A educação virou um ciclo de produção e correção automatizada, sem presença real do pensamento humano.
A IA apenas acelera a lógica de eficiência e aparência de produtividade já presente nas instituições.
O problema não é a IA, mas o modelo educacional que sempre foi voltado à performance e não à reflexão.
Avaliações em massa tornam impossível o acompanhamento individual e crítico dos alunos.
A única saída é a reforma estrutural: mais professores, menos alunos por turma e foco em processos realmente humanos.
IA na escola
Não há dúvidas que as instituições educacionais de todos os níveis estejam tomadas por textos gerados por inteligências artificiais, seja porque professores se utilizam das IAs para gerar provas, trabalhos e questões, ou seja porque os próprios alunos se utilizam das mesmas tecnologias para responder a essas questões e gerar suas dissertações. Tecnologias que não apenas criam o volume textual, mas geram as próprias ideias ou premissas contidas nestes mesmos trabalhos. “Pensam” por nós. Se o Chat GPT é utilizado para criar a proposta do texto e o elabora em uma redação de estudantes, e na pressa, professores utilizam o Chat GPT para avaliar estes textos, os seres humanos servem para quê no meio deste processo, se não para atrapalhar as máquinas? O Chat avaliou suas próprias criações.
Posto em uma cena que irá soar bastante familiar a muitos profissionais da educação: professores utilizam IA para criar trabalhos e provas que alunos utilizam IA para desenvolver como respostas. O cenário onde se sustenta esta troca incessante de textos gerados por Inteligência Artificial é o que chamamos de instituição de ensino. É, a esta altura, inescapável que, de alguma maneira, este seja o fato encontrado no dia-a-dia de docentes e discentes, e que o tráfego de textos gerados por IA faça parte da incumbência profissional e do ato educacional daqui em diante. Daí a pergunta: por que fazemos isso?
Esta nova realidade nos força ao questionamento sobre o que está realmente servindo como combustível destas instituições, quanto mais investiremos nossos recursos e tempo em instituições onde humanos trafegam lentamente entre eles os textos de máquinas? A quais fins estes espaços se destinam de fato a partir de agora? Para quê servirão as escolas, senão para trafegar textos do Chat GPT?
Por que isso ocorre?
Os espaços educacionais são instituições de gestão de “informação útil”. Útil porque sociabilizante, útil porque formadora, útil porque instrumental, útil porque produtiva. As críticas ao modelo disso que criamos como instituições educacionais na história são geralmente relacionadas ao fato de que pouco se reserva nelas como espaço para elaboração de reflexões verdadeiramente críticas. Escolas, faculdades, são espaços formativos de seres humanos produtivamente úteis, tudo isso sob a égide comercial de “profissionalização”. A promessa nunca realizada de que sairiam de lá prontos para serem profissionais.
Fica imediatamente claro o fato de que para estes fins, no interior destas instituições, as inteligências artificiais apenas aceleram alguns processos que antes eram de outra forma maquiados. Colar na prova ou copiar trechos de textos plagiados da internet sempre foram práticas comuns nos espaços estudantis. Essas são práticas inegavelmente inerentes à prática estudantil porque refletem justamente a lógica pela qual a instituição educacional foi construída, que é a lógica da eficiência. A prova visa verificar se a pessoa é capaz de responder à prova e nada mais - muitas vezes inclusive, dentro de um tempo estabelecido - em um modelo fabril de produção de resultados dentro de margens de aceitabilidade.
Estes recursos obtusos como “colar em provas” e “copiar textos prontos” são maneiras de aumentar a eficiência na busca por melhores resultados em menor tempo, dadas as grandezas de avaliação quantitativa destes processos. Basta assumir alguns riscos. Essa prática, embora condenada contra os alunos, não está em nada distante das práticas mais comuns das empresas nos mercados mundiais; a busca por eficiência através da precarização dos processos e dos materiais. Comemos plástico hoje em dia no lugar de alimentos orgânicos de alta qualidade justamente por esse mesmo motivo.
E por que isso é assim nas escolas? Porque estas restituições foram construídas na inerência das suas próprias estruturas, visando eficiência de investimento. A economia na contratação de professores, não apenas em seus salários, mas com relação à quantidade de professores disponíveis por alunos, força com que eles próprios tenham que achar subsídios - por vezes obtusos - para alcançar a eficiência esperada da formação de turmas de 60 ou mais alunos. Nestes vãos, os alunos inteligentemente criam fórmulas no exato instante em que compreendem como funciona a estrutura avaliativa da instituição educacional.
A inteligência artificial acelera a mentira
Já estávamos há muitas décadas nos enganando sobre o que é a educação nestas instituições. Tiradas raras exceções sustentadas por professores e professoras que são verdadeiros heróis anônimos, escolas podem com clareza ser reduzidas a máquinas de processamento e pasteurização cerebral por fórmulas produtivas e úteis mercadologicamente. Tudo isso em breves menções que nem sequer são suficientes para tornar os alunos operários hábeis no fim. Isso, o que de fato faz, é a experiência profissional dessas pessoas em seus empregos após os estudos. A escola nunca foi uma instituição de experiências profundas e transformadoras, infelizmente. Todos sabemos disso. As universidades nem sequer têm essa ambição no nível da graduação; são “profissionalizantes”. A inteligência artificial facilita e acelera os processos de enganação sobre as funções verdadeiramente desenvolvidas no espaço educacional. Podemos dizer que, por esse motivo, a IA “cai como uma luva” na esteira de produção e tráfego de textos gerados sem reflexão.
O que podemos concluir disso é que a inteligência artificial não é o problema, na verdade ela é a solução para um problema estrutural que tínhamos anteriormente, o fato de que as próprias instituições de ensino não propunham qualquer outra coisa senão o tráfego de papéis irrefletidos. Fosse a escola um espaço de reflexão crítica, a inteligência artificial com seus textos não teria encontrado tão perfeito caimento em sua estrutura, e a permeabilidade dessas tecnologias no âmbito educacional teria sido completamente diferente.
A solução?
Por vezes as soluções desabrocham justamente dos cenários menos prováveis. O absurdo traz consigo a necessidade de saídas alternativas já nos lembrava Camus. E é exatamente isso que tem acontecido com as instituições educacionais. O esvaziamento do seu sentido toma um curso histórico de diversas décadas. Isso se não quisermos concluir que instituições educacionais tenham sempre sido algo aquém das verdadeiras capacidades daquilo que consideramos por “educação”. Parecem-nos nunca terem de fato “chegado lá”.
A substituição do mínimo esforço humano da criação do conteúdo que é trafegado no interior dessas instituições por textos gerados por inteligência artificial reduz qualquer investimento nesse espaço a um desperdício descomunal. Por qual motivo sustentar uma instituição cara que serve apenas para trafegar textos do chat GPT? Não há qualquer necessidade de seres humanos para trafegar textos entre máquinas; elas o fariam melhor e mais rápido entre si. Seres humanos sendo utilizados por máquinas para trafegar textos de maneira analógica, fingindo ter sido eles os seus autores, revela um teatro tolo e contraproducente que, se não bastasse ser evidentemente trágico, revelaria-se também imensamente dispendioso.
Mas a presença desse fenômeno nos faz crer que algo possa mudar. A IA vai forçar todas as esferas sociais que possuem alguma influência na determinação sobre o que é um espaço educacional, a repensar suas funções e o seu funcionamento a partir deste novo modelo de mundo. Tendo comprovado o fato de que a IA se conforma perfeitamente ao modelo de geração fabril de textos irrefletidos dentro das escolas, poderíamos por fim concluímos que a estrutura exige, para sua própria sustentação, grande investimento para contratação de mais profissionais de educação, para que estes possam modificar as metodologias de avaliação dos seus alunos. Provas às centenas são esforços inúteis.
Enquanto cada professor tiver uma sala de 60 alunos, cuidando de 10 turmas, ele jamais poderia avaliar de outra maneira senão pelo puro tráfego de papéis, todos os seus 600 alunos. Todas aquelas sonhadas dimensões educacionais que se dariam pela conversa e o acompanhamento individuais, as chances de trocas de experiências, de tutoria e de experimentações com cada aluno, só poderiam ocorrer com grupos extremamente menores de estudantes, para que os profissionais de educação pudessem se dedicar de fato, de maneira a viabilizar uma avaliação qualitativa e não meramente quantitativa.
A inteligência artificial nas escolas comprovou que o sistema educacional vigente chegou no seu limite. Necessitamos de mais professores para que cada um possa cuidar de grupos menores de alunos, onde teríamos seres humanos dedicados a seres humanos, cuidadosamente elaborando processos educacionais para fins verdadeiramente e unicamente humanos. Professores como tradutores de conteúdo a cada realidade individual. Uma utopia? Talvez soasse dessa forma algumas décadas atrás, mas a partir de agora, com a inteligência artificial e o desmoronamento do sistema educacional atual que ela representa, talvez seja de fato a única saída. Estas questões poderiam reacender a luz da esperança de uma urgente e necessária reforma do sistema educacional e seus propósitos. Ou vamos seguir no teatro dos tolos trafegando textos irrefletidos entre as máquinas que pensam por nós?

Excelente reflexão. O rei tem estado nu há décadas, desde que o aluno passou a ser tratado como cliente. Nas instituições privadas e em muitas públicas o aluno representa receita e o professor, despesa. Haja o que houver, o aluno será aprovado para evitar evasão. A dupla ensino-aprendizagem quase não encontra espaço nessa dinâmica, mas festejamos a ilusão de que tudo caminha bem.